Chega De Músicas Natalinas Chatas! [Comentários – Parte 1]

Neste artigo do New York Times, Scott Vener, diretor musical de uma famosa série de TV, lamenta o fato de as playlists terem substituído seus blogs de música favoritos e declara que sente falta de ler fãs apaixonados por música falando sobre cada canção que costumavam postar. Eu concordo com ele. Quer dizer, acredito que ouvir boa música é sempre bom, mas saber o porquê de certas canções serem especiais para alguém me faz percebê-las “com outros ouvidos” – o que torna a experiência bem mais pessoal e, muitas vezes, faz com que elas passem a ser especiais também para mim, aproximando-me de alguma forma desse alguém (e/ou deixando esse alguém mais próximo de mim?). Por isto, decidi comentar algumas músicas da minha playlist No More Boring Christmas Songs! [Chega De Músicas Natalinas Chatas!]. Espero conseguir contribuir ao menos um pouquinho para que a beleza dessas canções seja descoberta e apreciada. 🥰🎶



MÚSICA PELOS MEUS OUVIDOSCHEGA DE MÚSICAS NATALINAS CHATAS!

DO THEY KNOW IT’S CHRISTMAS TIME?
Band Aid
* [Bob Geldof and Midge Ure]

Composta em 1984 pelo multifacetado Bob Geldof** e Midge Ure com o propósito específico de arrecadar fundos para uma campanha contra a fome na Etiópia entre 1983 a 1985, Do They Know It’s Christmas Time? conta com alguns dos maiores nomes da música internacional nos vocais principais: Bono (U2), George Michael (Wham!), Phil Collins (Genesis), Sting (The Police), Boy George (Culture Club), Paul Young (Kat Kool & The Kool Cats), seus próprios compositores – Bob Geldof (The Boomtown Rats) e Midge Ure (Ultravox) – e muitos outros. Ou seja, é icônica demais para ficar de fora desta playlist.

*Supergrupo (grupo musical formado por artistas já renomados) criado por Geldof e Ure especialmente para a gravação desta música.
**Cantor, compositor e ator irlandês que interpretou Pink, personagem principal do drama musical The Wall, baseado no álbum homônimo do Pink Floyd – obras que tiveram grande impacto sobre minha vida.

⚠️ Atualização em 20.12.2024: continuo achando impossível ignorar a relevância histórica e humanitária dessa música. Para quem talvez não saiba, apesar das polêmicas envolvendo sua letra, foi o sucesso dessa gravação que viria a inspirar o lançamento de muitas outras músicas beneficentes, dentre as quais We Are The World, de Lionel Ritchie e Michael Jackson, provavelmente seja a mais conhecida. Ainda assim, receio que o lugar dela na minha vida se restrinja a um caderno da época de adolescente no qual eu costumava escrever à mão as letras de diversas músicas. Tirando a lembrança desse hobby e os muitos artistas ilustres envolvidos, tendo tido algumas dúvidas se ela faz jus ao título dessa playlist. Portanto, pode ser que no próximo ano ela já não esteja mais aqui.

[faixa #2]


🆕 ♪ THANK GOD IT’S CHRISTMAS
Queen
[Brian May, Roger Taylor]

Depois do Natal em si, creio que nada no mês de dezembro é mais típico do que fazer um balanço do ano que chega ao fim – e se essa visita aos meses passados puder ser feita por aquele que considero simplesmente o melhor cantor de todos os tempos, melhor ainda. Nesta balada de uma das maiores bandas de rock do mundo, o que ouvimos não é surpresa: o sofrimento é universal. Logo no primeiro verso, encaramos o fato de que todos nós tivemos nossas cotas de lágrimas e, em meio a esperanças e medos, percorremos caminhos estranhos, vivemos dias confusos que fizeram do ano um período árduo e longo. Mas, pelo menos por uma noite, que não entendemos por que não pode se repetir todos os dias, agradecemos a Deus porque é Natal.

Vai ser um pouco estranho começar essa série de comentários com duas músicas que têm me causado dúvidas sobre suas permanências nesta playlist, mas, apesar de verdadeiramente gostar da universalidade da letra e chegar a aumentar o volume no começo, às vezes temo que nem mesmo a voz de Freddie Mercury seja suficiente para mantê-la aqui. Depois de certo ponto, as repetições me soam um tanto desnecessárias (sempre tive problemas com repetições; não entendo por que as pessoas parecem precisar tanto delas). Em todo caso, ainda que essas duas faixas sejam futuramente substituídas, continuo achando que elas merecem ser conhecidas. Mas tratarei, enfim, daquelas que têm lugar garantido nos meus ouvidos e no meu coração.

[faixa #3]


ANOTHER YEAR HAS GONE BY
Patrick Scott, com participação especial de Eveline Suter
[Bryan Adams, Eliot Kennedy]

A presença desta música nesta playlist pode surpreender alguns. “Você gostando de música pop?” – posso ouvir nas entrelinhas. Sim, eu gosto de músicas pop, desde que sejam boas. Esta playlist, inclusive, está repleta de outras. Afinal, como mencionei na semana passada, uma playlist de Natal pode não ser o local mais adequado para estilos mais alternativos. Surpresa mesmo é o que vou fazer agora: dedicar publicamente essa música àquele que, depois de tantos anos que se passaram – sendo os últimos particularmente difíceis – continua a estar ao meu lado, segurando minha mão por quaisquer caminhos que tenhamos que seguir, quer cheios de flores ou de espinhos. ILY-M&D ♡ [mensagem interna]

[faixa #4]


🆕 ♪ WHITE CHRISTMAS
David Archuleta
[Irving Berlin]

Para quem nasceu e cresceu em um país tropical, um Natal Branco é uma imagem que só existe em cartões postais, filmes e, para mim, sobretudo nas histórias em quadrinhos. Desde pequena fascinada pelas palavras, sempre preferi os personagens de Walt Disney porque achava o vocabulário deles muito mais rico do que o de uma certa turma bem popular na República das Bananas. Mas era frustrante ver Huguinho, Zezinho e Luisinho brincando na neve enquanto que ao meu redor o que existia era apenas “um sol para cada um”.

Cortando para 2024, embora viva em terras geladas já há alguns anos, conforme contei na semana passada, foi a mudança do 39º andar para uma casa que me fez querer sentir aqui aquele espírito natalino até então restrito ao universo fictício. É que, vista quase das nuvens, a neve parece ainda muito distante. Só em um pavimento térreo aquele charme todo das paisagens branquinhas de tudo se materializa bem abaixo do nosso nariz – e é praticamente impossível contemplá-las sem ter White Christmas ecoando nas nossas mentes.

Foi este clássico, que ocupa o segundo lugar no ranking de músicas natalinas mais regravadas do mundo, que me inspirou a revisitar minha antiga e privada “playlist de Natal” – na verdade, uma coletânea de canções predominantemente melancólicas que apenas mencionavam esta data como pano de fundo para suas histórias – e atualizá-la com as músicas que ela hoje reúne. Sinceramente, não foi fácil encontrar uma versão que não fosse no mínimo monótona, mas o talento de David Archuleta sempre surpreende.

Nesta que é uma das músicas mais singelas desta playlist, o desejo do eu-lírico não poderia ser mais modesto para um habitante da América do Norte: um Natal branco, como o que ele carinhosamente guarda em suas memórias. Quando se vive aqui, não é difícil entender o porquê. Pelo menos para mim, não importa quantas vezes eu veja a neve, ela sempre concretiza ao meu redor o Natal que antes eu conhecia apenas pelos quadrinhos daqueles simpáticos patinhos – e é sempre tão mágico quanto quando a vi pela primeira vez! ☃️

[faixa #17]


🆕 ♪ SILENT NIGHT (BE STILL)
Rend Collective
[Franz Xaver Gruber, Joseph Mohr • Chris Llewellyn, Garath Gilkeson, Stephen Mitchell]

Aqui vou eu cutucar uma caixa de maribondos… Apesar de ter sido declarada Patrimônio Cultural Imaterial pela Unesco e das mais de 137 mil versões que fazem de Silent Night a canção natalina mais regravada do mundo, se euzinha aqui tivesse que escolher uma só para ganhar o título de “Música de Natal mais chata de todos os tempos”, esta seria uma das fortíssimas candidatas. Especialmente nas versões brasileiras, alguém teve a estranha ideia de chamar de “Noite De Paz”, outro alguém de “Noite Feliz”, a adaptações tão arrastados que mais me remetem a uma noite de incomensurável tédio presenciando não a felicidade pelo nascimento de um bebê, mas o mais triste dos velórios! Não servem sequer para me fazer dormir.

Confesso que já nem tinha esperança de achar uma versão minimamente audível deste clássico tão popular. Um dia porém, me deparei com essa versão da banda gospel Rend Collective (a Irlanda sempre massageando meus ouvidos), que me apresentou a uma beleza que eu jamais havia ouvido nessa música. Alguém finalmente conseguiu captar a atmosfera de silêncio, reverência e paz retratadas na letra original em alemão, sem com isso nos mergulhar em um poço sem fundo de depressão. Mais do que isso, ao acrescentarem a ela Be Still, de composição da própria banda, convidam-nos a nos acalmarmos através de arranjos que, magicamente mesclando serenidade com alegria, ecoam por toda nossa alma.

[faixa #19]


🆕 ♪ PAT-A-PAN
David Archuleta
[Bernard de la Monnoye]

Composta originalmente em borgonhês, dialeto falado no leste da França durante a idade média, Guillô, Pran Ton Tamborin [Willie, Pegue/Traga Seu (Pequeno) Tambor] foi publicada pela primeira vez em 1720 – o que faz dela a música de origem mais remota desta playlist e uma das mais carregadas de História. Muito além de uma região que produz alguns dos mais renomados vinhos do mundo e de batizar a cor deles com seu nome, a Borgonha já foi um dos mais importantes centros europeus de riqueza, poder, ciência e arte. Foi nesse cenário que Bernard de la Monnoye, crítico, filólogo e poeta sempre presente nos círculos intelectuais de Dijon, capital da província, compôs Noël Bourguignons [Natal em Borgonha], uma coletânea de treze canções natalinas narradas em linguagem simples que se tornariam altamente populares.

No topo dessa popularidade está Guillô, Pran Ton Tamborin, em que pastores convidam os pequenos Robin e Willie, personagens comuns nas canções provençais da época, a pegar seus instrumentos para, ao som deles, cantar e dançar em louvor ao recém-nascido Rei dos Reis. Para além do ritmo festivo, a alegria pedida aos personagens se reflete na música também através das onomatopeias que tentam reproduzir os sons tocados pelos meninos. Da flauta de Robin vem o “tu-re-lu-re-lu”. Do tambor de Willie vem o “pat-a-pat-a-pan” que viria não apenas a intitular as versões em inglês, mas sobretudo a inspirar Katherine Kennicott Davis a compor The Little Drummer Boy, cuja letra, dentre as canções natalinas tradicionais, é provavelmente a minha preferida, conforme comento logo a seguir.

[faixa #22]


♪ THE LITTLE DRUMMER BOY
Zack King
[Katherine Kennicott Davis]

Como mencionado no comentário anterior, dentre as canções natalinas tradicionais, a letra desta é provavelmente a minha preferida porque é a que, na minha opinião, melhor traduz a essência do Natal: oferecer o que se tem de melhor ao aniversariante. Claro que gosto também da melodia e do ritmo, mas acho particularmente tocante a simplicidade do garotinho que, sabendo-se ser um menino pobre e sem recursos para levar presentes finos a um rei recém-nascido que fora convidado a visitar, tem a ideia de oferecer ao bebê o que ele faz de melhor: tocar seu tambor. Com a permissão de Maria e a ajuda do boi e do cordeiro marcando o tempo, o menino Jesus é saudado com o som de um simples “pam ram pam pam pam”. Até o presente momento, não conheço qualquer outra onomatopeia que tenha um significado tão profundo.

O que considero ser o maior desafio de musicar uma história ao mesmo tempo tão simples e tão profunda é que, pelo menos como eu a imagino, esta música é (ou deveria ser) uma cantiga de ninar. Agora, como tocar uma cantiga de ninar em um tambor? Parece um tanto contraditório, para não dizer impossível. Nem mesmo uma das minhas bandas favoritas conseguiu tal façanha, mas, sim, há esperança! Tendo ouvido mais de mil gravações dessa música (depois deste número, parei de contar), consegui encontrar dezenas de versões verdadeiramente muito boas. Até agora, acho que quem se saiu melhor nessa missão foi a pouco conhecida banda texana Zack King.

PS: Imaginem minha alegria quando, apenas um dia depois de voltar pra casa com uma bateria, entro em uma loja na semana passada e vejo a almofada abaixo. Vou levá-la comigo por onde quer que eu vá! 🤗

⚠️ Atualizações em 20.12.2024:

  1. A bateria mencionada ano passado era só uma brincadeira inesperadamente alugada por um mês ao visitarmos uma loja de instrumentos para comprar um violão. Neste ano, como mostra a foto, ganhei uma só para mim. Para sorte dos vizinhos, o isolamento acústico por aqui é muito bom! 🥁
  2. A tentativa de expressar em inglês a onomatopeia que intitula a canção anterior, Pat-A-Pan, foi o que inspirou a composição de The Little Drummer Boy. Acho fascinante a capacidade que a Arte tem de fazer com que a beleza se propague por caminhos jamais imaginados por seus criadores. 🥹

[faixa #23]


♪ I SAW MOMMY KISSING SANTA CLAUS
The Lidls
[Tommie Connor]

O que tenho a dizer sobre essa música é tão simples quanto ela mesma: para mim, a inocência do garotinho que fica perplexo ao flagrar a mãe beijando o Papai Noel é tão fofa. Imerso em seu mundo ingênuo, ele se pergunta como seu pai reagiria se tivesse visto a mesma cena. Mal sabia ele…

[faixa #24]


♪ I WANT A HIPPOPOTAMUS FOR CHRISTMAS (HIPPO THE HERO)
Darren Criss
[John Rox]

Simplesmente AMO a obsessão e a capacidade de negociação desse garotinho que já pensou em praticamente todos os argumentos possíveis para convencer os adultos de que seu desejo de Natal – nada menos do que um hipopótamo – é perfeitamente razoável: (1) só serve se for um hipopótamo; (2) Papai Noel não vai se importar com o pedido, será até mais fácil para ele deixar o presente na porta da frente do que passar pela chaminé suja; (3) ninguém precisa se preocupar com sua segurança porque hipopótamos são vegetarianos (informação esta que ele obteve de seu professor); (4) seu “bichinho” poderá morar na garagem (afinal, na América do Norte as garagens raramente são usadas para guardar carros); (5) ele se compromete a alimentar, dar banho e até massagear o mais novo membro da família; (6) os hipopótamos gostam dele também (o que é afirmado com uma convicção invejável!); e (7) o que acredito ser o argumento que mais facilmente derrete o coração de qualquer pai/mãe – a alegria que seu filho sentirá na manhã de Natal quando descer as escadas e encontrar o hipopótamo paradinho ali. Prevejo um advogado e/ou um pesquisador brilhante! 🤓

[faixa #26]


♪ RUDOLPH, THE RED-NOSED REINDEER
Neil Diamond
[Johnny Marks*]

É incrível como a letra dessa música resume nas 111 palavras de sua versão original toda uma discussão recente sobre uma prática antiga: bullying. Embora nunca tenha sofrido bullying, sempre soube o que é ser diferente em praticamente todos os sentidos possíveis – é uma solidão existencial que só quem é diferente sabe do que se trata. Por isto, é impossível para mim não ser particularmente tocada com o drama vivido por Rudolph – uma rena que, por ter um nariz vermelho e brilhante, é frequentemente ridicularizada pelas outras e excluída de suas brincadeiras. Numa noite nublada, porém, Papai Noel percebe que o nariz de Rudolph poderia guiar seu trenó e salvar o Natal de todos. Acho tão comovente ver Rudolph sendo, primeiro, notado por alguém que tem um olhar especial para a relevância de sua singularidade e, depois, passando de ridicularizado e excluído a herói da história. Só queria ser encontrada pelo mesmo Papai Noel! 😅

“PS Sério”: quem me conhece intimamente sabe que nunca fui e nunca serei a favor de qualquer ato de ridicularização e/ou agressão a uma pessoa. Sequer consigo entender, por exemplo, qual é a sentido de rir quando alguém escorrega em uma casca de banana (cena clássica em roteiros de “humor” e que, para mim, já é uma amostra do que eu chamo de violência que me impede de assistir a tal despropósito). Dito isto, confesso que esse tema tomou uma proporção que mais me dá preguiça do que ganha meu respeito. Esse mundo em que a gente tem que ficar medindo cada palavrinha que diz porque um indivíduo não foi minimamente preparado para lidar com algumas verdades é cansativo demais! A propósito da história de Rudolph, grandes clássicos da Literatura infantil têm sido afetados por tanta fragilidade (sim, isto é ser frágil demais; não sensível demais!). Até mesmo os pensamentos que compartilho aqui poderiam fluir mais rapidamente se, diversas vezes, eu não precisasse gastar um bom tempo pensando em qual palavra usar para chamar “seis” de “meia-dúzia”. “Ah, mas é fácil você dizer isso se nunca sofreu bullying” – posso prever as críticas, expressadas ou contidas. Sim, tive o privilégio de nunca ter sofrido bullying. Porém, para citar só casos públicos, há diversas pessoas famosas que sofreram bullying, mas nem por isso tiveram suas vidas paralisadas ou saíram por aí matando quem os perturbava. Pelo contrário, ao invés de permanecerem no cômodo papel de vítimas, fizeram do motivo de serem ridicularizadas a base sobre a qual construíram suas carreiras – algumas muitíssimo bem sucedidas e, por que não dizer, verdadeiramente brilhantes. É claro que sei que há casos que são realmente sérios, mas tanto exagero de fato me dá preguiça.

*Baseada no conto homônimo de Robert L. May, de 1939.

[faixa #27]


🆕 ♪ SANTA BABY
Colbie Caillat
[Joan Javits, Philip Springer, Tony Springer]

Um casaco de pele,* um conversível azul claro, um iate, uma mina de platina, um duplex, cheques assinados, uma árvore de Natal enfeitada com “decorações” compradas em uma das joalherias mais luxuosas do mundo, um anel (presumidamente, de noivado): parece a descrição dos bens de uma jovem abastada, mas é uma lista de desejos endereçada a ninguém menos do que Papai Noel, devidamente acompanhada de garantias de comportamentos angelicais e grandes sacrifícios durante o ano que se passou, bem como de renovadas promessas para o ano que virá – isto é, se seus nada modestos pedidos forem atendidos.

Composta com a intenção de ironizar as famosas listas de presentes enviadas ao “bom velhinho” todo final de ano, as diversas gravações dessa música me remetem muito mais a uma pessoa que, assim como o garotinho obcecado por um hipopótamo, tem natas habilidades de negociação que eu não me vejo aprendendo nem com treinamento intensivo (e como me seriam úteis!). Mas a grande pergunta que não cala dentro de mim quando ouço esses versos é: alguém aí tem o endereço desse mesmo Papai Noel? Prometo que minha lista de desejos sai bem mais em conta 😇; só não sei se é exatamente mais fácil de realizar. 😬

*Item que só menciono aqui porque, no contexto da história, é coerente com os desejos da personagem, quer ela tenha um olhar crítico ou insensato sobre presentes de Natal. Mas, sem querer ser ativista já sendo, sempre vale lembrar que animais não foram criados para nos vestir, mas para serem cuidados por nós. ♡

[faixa #29]


🆕 ♪ DE PRESENTE PRA VOCÊ
Mar Aberto
[Thiago Mart, Gabriela Luz]

E quem disse que quem tem o rock pulsando nas veias não pode ter seus momentos, ainda que raros, de fofura? No caso, reconheço, fofura extrema. 🤭

Mas fazer o quê? Foi exatamente no Natal de 2019, quando eu estava começando a montar essa playlist nos moldes que ela existe agora, que conheci essa música e por ela me encantei logo na primeira vez que ouvi (apesar de ainda hoje ter alguns incômodos – às vezes moderados, às vezes um pouco maiores – com uma das vozes do duo). Para minha própria surpresa, ela acabou marcando positivamente um período que, apesar de muito difícil, ainda parecia promissor. Poucas semanas depois, o mundo seria virado de cabeça pra baixo por um vírus que eu gostaria que tivesse sido só um pesadelo. Não foi. Mas o que importa agora é que, ouvindo esta música, sou tomada por uma vontade contagiante de cantá-la, repetidas vezes, do jeito que minha voz permite e, ainda que por poucos minutos, vivo em um mundo que ainda vale a pena! 💭

[faixa #37]


🆕 ♪ BABY, IT’S COLD OUTSIDE
Colbie Caillat, com participação especial de Gavin DeGraw
[Frank Loesser]

Para quem ouve com atenção é evidente: não há uma única referência ao Natal nessa música. Ainda assim, quando se mora na América do Norte, é quase impossível desassociar o frio que permeia seus versos desta data sabidamente gelada. Estrategicamente, algumas lojas até escrevem seu nome em charmosas plaquinhas que posicionam em frente às suas portas. Para transeuntes que passam tremendo de frio, tais plaquinhas parecem um aconchegante convite a entrar (e, por que não?, deixar uns trocados ali).

Nem clássico natalino, muito menos isca para atrair clientes – A intenção inicial de Frank Loesser, compositor de alguns musicais da Broadway, ao escrever essa música em 1944 era bem mais modesta: cantá-la em dueto com sua então esposa Lynn Garland na festa de inauguração da casa deles em Nova Iorque, como maneira de sinalizar aos convidados que estava na hora de ir embora. O sucesso foi tanto que passaram a ser chamados para as melhores festas da cidade, e 5 anos depois, a música se tornou até tema de filme.

Dezenas de versões e polêmicas depois (ô mundo que anda chato!), em 2012 Colbie Caillat nos deu de presente de Natal essa delícia de dueto com Gavin DeGraw, no qual incorporam magistralmente a essência dos sentimentos dos personagens: ela, preocupada em voltar logo para casa a fim de atender a expectativas que terceiros têm sobre sua vida; ele, completamente hipnotizado pela presença de sua amada e se valendo de todos argumentos possíveis, inclusive do frio no lado de fora, para tentar, em vão, convencê-la a ficar.

Confesso que, além da química entre os intérpretes, um dos elementos que me fazem preferir essa versão a outras também muito boas é o fato de terem eliminado um verso com referência a um vício pelo qual tenho a mais absoluta aversão (repudio todos os vícios, mas dois em particular me tiram ainda mais do sério). Agora, mesmo que considerasse a totalidade da letra original, para a minha pequena cabecinha, enxergar nela qualquer coisa além de um casal de apaixonados é falta demais do que fazer. Haja paciência!

[faixa #39]


🆕 ♪ LAST CHRISTMAS
Patrick Scott, com participação especial de Invivas
[George Michael]

Não tenho dados para comprovar meu palpite, mas ousaria arriscar que, além das fronteiras das regiões frias, esta é a música mais equivocadamente associada ao Natal mundo afora. Tudo bem que nela, eliminadas as estrofes repetidas, o Natal é mencionado duas vezes e sussurrado uma terceira. Mas, assim como em Baby, It’s Cold Outside, basta prestar um pouquinho só de atenção à letra para saber que ela nem de longe trata da festividade cristã, mas de um coração pra lá de partido (e ainda iludido).

Confesso que me interessei mais por essa música a partir da infeliz coincidência que foi a precoce morte de George Michael em 25 de dezembro de 2016. Verdade seja dita, a versão original do Wham! é executada tão exaustivamente por onde quer que a gente se atreva a perambular nessa época do ano que, para mim, nem mesmo uma das vozes mais lindas do mundo foi capaz de livrá-la de bater, ainda que levemente, nas portas da monotonia – isso pra não falar das centenas de regravações altamente questionáveis.

Para minha alegria, essa versão acapella de Patrick Scott, com participação especial do grupo suíço Invivas, verdadeiramente trouxe nova vida (fazendo jus ao significado do nome do grupo no dialeto romanche: “na vida, vivo”) a esse clássico popular já um tanto desgastado. Pelas suas belíssimas vozes, sou capaz de sentir as dores do eu-lírico que, apesar de se dar conta de ter sido simplesmente usado por uma alma de gelo, sabe-se ainda frágil o bastante para cair novamente na lábia de quem não mereceu seu amor.

Apesar do enredo melancólico, os artistas imprimiram nesta versão um entusiasmo contagiante. Não consigo ouvi-la sem ter vontade de “cantar” junto (eu “cantando” só mesmo com aspas!) e me balançar toda. Ouço (e amo!) nela uma bateria que não existe e chego a prender a respiração com o grave de quando cantam “Me? I guess I was shoulder to cry on”. Para minha própria surpresa, é uma das músicas que mais ouço no modo “repeat” por sei-lá-quanto-tempo. Se é um equívoco associá-la ao Natal, realmente nem me importa! 😇

[faixa #45]


🆕 ♪ THIS MUST BE CHRISTMAS
Kodaline
[Steve Garrigan, Mark Prendergast, Jason Boland, Vincent May]

Nesta bela música de uma das minhas três bandas irlandesas preferidas, o sentimento do eu-lírico em muito se parece com o que eu costumava experimentar antes de ter minha relação com o Natal ressignificada pela montagem desta playlist: sabendo-se sozinho e entediado em uma noite cujo espírito ao seu redor é bem diferente daquele que toma conta de seu interior, ele não suporta mais ouvir as músicas que as rádios tocam, mas acaba cantando como quem apenas segue automaticamente um fluxo.

Um detalhe além da música, no entanto, me deixa bastante intrigada. A banda disponibilizou no Spotify sua própria playlist de canções natalinas. This Must Be Christmas, claro, é a primeira. O que não consigo acreditar é que, logo na sequência, colocaram uma faixa que eu particularmente, a despeito do status de lenda alcançado por seu compositor, acho simplesmente uma das piores músicas de todos os tempos! Com algumas poucas exceções, o que vem depois não é lá muito melhor. Assim, realmente não há quem aguente!

Agora, como é que pessoas que compuseram uma música tão bonita gostam de músicas tão duvidosas? Tico e Teco entram em curto-circuito pensando sobre isso. 🤷🏻‍♀️

[faixa #66]


🆕 ♪ IT MUST HAVE BEEN LOVE (CHRISTMAS FOR THE BROKEN HEARTED)
Roxette
[Per Gessle]

Na primeira versão desta playlist (2022), esta era a faixa que abria o caminho para todas as outras. A intenção era realmente provocar a pergunta: “mas o que essa música tem a ver com o Natal”? Na verdade, nada. Isto é, nada além de uma única menção ao fato de que a dor deixada pelo fim de um relacionamento que “deve ter sido amor” está sendo vivenciada em um “difícil dia de Natal” (que na consagrada versão para o filme Uma Linda Mulher, bem como em outras, foi convertido em um “difícil dia de inverno”).

Dentre todas as músicas aqui reunidas, esta é com certeza a que mais profundamente marcou minha adolescência, tempo ao qual eu gostaria de voltar, se possível fosse. Cravada de maneira indelével na minha memória está a lembrança dos dias e noites em que, ao som da versão do álbum Tourism (1992), infelizmente dividida em duas nas edições posteriores, eu começava a experimentar em mim sentimentos que até então só conhecia pelas canções. Ainda hoje o som daquela gaita penetra os lugares mais íntimos da minha alma!

[faixa #72]


🆕 ♪ CHRISTMASES WHEN YOU WERE MINE
Taylor Swift
[Taylor Swift, Liz Rose, Nathan Chapman]

Sim, Taylor Swift! Depois de Blank Space, que eu particularmente considero uma das músicas mais geniais da história da humanidade (embora eu não tenha autoridade de gênio para avaliar 🤓😂), foi esta a canção que, tempos atrás, me despertou interesse em ouvir a discografia completa da loirinha que dominou os palcos do mundo inteiro neste ano. De onde saíram duas preciosidades como essas, haveria de ter mais – e tinha! Quem sabe um dia desses eu faça uma playlist para reunir minha preferidas. Acham que eu estou brincando?

De volta a Christmases When You Were Mine, precisa explicar muito para sentir o coração partido? Não precisa. Ainda assim, a capacidade de Taylor de colocar em 186 palavras uma história que nos faz, a cada verso, visualizar as lembranças de uma vida inteira, bem como de sentir a solidão do eu-lírico, é de fato extraordinária. Consola-me imensamente saber que nem tudo que se torna popular é um amontoado de lixo que jamais poderia estar em qualquer outro lugar senão no esgoto. A esperança é mínima, mas ainda existe!

[faixa #74]


♪ PARA NÃO SER TRISTE
Glaucio Cristelo (em seu projeto “Piano Rock”)
[Edson Borges]

Atrevo-me a apostar que qualquer brasileiro que tenha sido criança (ou mesmo adulto) nos anos 80 tem essa música carinhosamente guardada em suas mais preciosas memórias. Para quem não teve essa sorte, esta música foi a trilha sonora de um comercial de Natal estrelado por um garoto que, atrasado para a apresentação do coral, atravessou a cidade o mais rápido que pôde em sua bicicleta, a fim de chegar a tempo para fazer seu solo. Ainda hoje, é com uma certa apreensão que acompanho seu trajeto, torcendo para que ele consiga. Infelizmente, dentre as versões disponíveis no Spotify, não conheço uma única que seja cantada por algum cantor minimamente decente (conheço uma que é no máximo tolerável; mesmo assim, não me emociona). Mas, para quem tem o piano de Glaucio Cristelo, não há necessidade de palavras. Se você estiver passeando por um shopping do Rio de Janeiro e der a sorte de encontrá-lo se apresentando, pare tudo o que estiver fazendo e simplesmente se deleite!

[faixa #75]


♪ RIVER
Haley Dreis
[Joni Mitchell]

Eu precisaria escrever muitos e longos livros para tentar transmitir um pouquinho do que essa música faz com a minha alma! Dentre os idiomas que conheço um pouco, ainda não encontrei uma palavra única que seja capaz de definir o efeito que ela tem sobre mim. O que sei é que ela, sim, me define; me define, me fascina, me hipnotiza, me encanta, me tira o fôlego! É uma das músicas que sou capaz de ouvir repetidamente por horas sem me lembrar do que é fome ou sede. Para mim, esta é uma das composições mais lindas de todos os tempos! Não me admira que tenha sido regravada por centenas de artistas, mas essa versão da Haley Dreis, uma cantora americana relativamente pouco conhecida, é um primor que acho difícil de ser superado. Eu poderia morrer – realizada e em paz – depois de ouvir essa música!

[faixa #78]


♪ ANGELA’S SONG
Dolores O’Riordan
[Dolores O’Riordan]

Para entender melhor essa música, vale a pena assistir Angela’s Christmas, uma animação ambientada em Limerick* (Irlanda), que narra a história de uma garotinha que, movida pelo desejo inocente de assegurar que todos tenham um bom Natal, se envolve em algumas confusões para “resgatar” o bebê Jesus do frio da manjedoura e envolvê-lo em um cobertor quentinho. Maaas… É Dolores O’Riordan! Quem precisa entender para ser profundamente tocado? Basta sentir!

*Cidade natal de Dolores O’Riordan, (infelizmente, falecida) cantora, compositora e musicista irlandesa que liderou uma das minhas bandas favoritas – The Cranberries – e será para sempre a dona de uma voz que alcança e habita os esconderijos mais secretos da minha alma!

[faixa #80]




Para este Natal é só. Será que ano que vem tem mais? 😇
Enquanto não sabemos, eis aqui playlist completa. Feliz Natal! 🎄


▷ Exceto quando precedidos pelos botões 🆕 ou ⚠️, todos os comentários acima foram originalmente publicados em 21 de dezembro de 2023 no (agora inativo) perfil Musings N’ Music no Medium.


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