Enquanto Ainda Estamos Vivos

Desde muito jovem, sou diariamente consumida por uma vontade avassaladora de escrever. Para mim, escrever é um instinto natural e forte, aparentemente embutido no meu sangue, assim como respirar. O que tem tirado minha paz, no entanto, é esse desejo contra intuitivo (dado o quão reservada e seletiva eu sou) de compartilhar o que escrevo, sejam minhas impressões sobre uma música ou livro, por exemplo, ou os meus pensamentos (muitas vezes loucos), esperando ambiciosamente que pelo menos alguns deles possam eventualmente tocar a alma de alguém, assim como as obras de tantas pessoas que admiro – e que nunca, jamais, saberão da minha existência – têm tocado a minha, às vezes profundamente. Conversando com uma de minhas melhores amigas sobre essa ambição, ela me perguntou sem rodeios: “Você não consegue pensar em algo menor”?

Bem, aparentemente, não consigo. Ainda assim, minhas razões para resistir a esta tentação insana de publicar meus escritos vão desde sentimentos do quanto valorizo – e preciso profundamente – da minha privacidade até outros que os psicólogos provavelmente rotulariam como “síndrome do impostor” (“Não sou boa o suficiente para isto”). Além disso, a essa altura da existência humana, qualquer pessoa que tenha dois neurônios já percebeu que a Internet é um território de ódio crescente onde as pessoas, por alguma lógica estranha (ou, mais provavelmente, pela total falta de qualquer lógica), dedicam seu tempo para compartilhar e atacar publicamente o que não gostam, ao invés de apenas focarem e promoverem o que gostam. Não é em vão que tenho evitado de todas as formas me envolver em qualquer tipo de rede social. Elas não parecem um bom lugar para se estar, mas sim mais uma evidência de que o mundo está indo de mal a pior.

“Lá vem a pessoa negativa” – Muitos estão pensando agora. Estou apenas falando de fatos, no entanto. Lidar com dados está na essência da minha formação, mas não vou mergulhar nessa discussão; esse não é meu propósito aqui. Simplesmente não consigo deixar de pensar que na última vez que considerei esta ideia, o mundo inteiro foi subitamente atingido por esta surpresa amarga que mais parece um enredo de ficção científica: uma pandemia. Ingenuamente acreditando que em breve estaria controlada, resolvi esperar um pouco mais. Eu não queria que meus pensamentos estivessem ligados àquele pesadelo. Dias se passaram. Semanas se passaram. Meses se passaram. Anos se passaram. Quando o número de mortos finalmente começou a diminuir, o mundo foi mais uma vez surpreendido por algo que eu (de novo ingenuamente) assumi estar restrito aos livros de História: uma guerra! “Vai acabar logo” – pensei (e desejei). Mais uma vez, semanas, meses, anos se passaram e, poucos dias depois de finalmente decidir retomar meu projeto engavetado, bum!, outra guerra!

“Não vou escrever nada. Vou apenas sentar, cruzar os braços e esperar o fim do mundo. Não vai demorar muito” – Estes foram alguns dos primeiros pensamentos que passaram pela minha cabeça naquela que deveria ser apenas mais uma manhã de sábado. Compartilhando esse sentimento com outra das minhas melhores amigas, ela disse: “Nããão! Enquanto o mundo ainda existe, precisamos tornar o nosso tempo aqui agradável” – e ela está absolutamente certa! Tragédias sempre existirão. Uma ainda nem acabou e outra já começa. Se eu continuar esperando que elas acabem para poder começar a fazer o que quero, o que acredito ser significativo, então minha própria vida se transformará no que é possivelmente (se não provavelmente ou mesmo certamente) a pior e mais triste de todas as tragédias: estar morto enquanto ainda se está vivo. Então, cá estou, tentando fazer com meu tempo aqui na Terra valha a pena viver, primeiramente para mim mesma e, espero, também para aqueles que me rodeiam.

Embora eu esteja 100% consciente de que não vou mudar esse mundo louco (a idade de ser tão ingênua está agora em um passado distante), aquela idealista incorrigível que vive dentro de mim ainda deseja torná-lo um lugar de alguma maneira melhor – e, para mim, a beleza é uma das poucas coisas que podem fazer isso. Mesmo assim, sei que nunca serei alguém que cria beleza, pelo menos não o tipo de beleza que toca as partes mais profundas da minha alma. Ao escrever, porém, talvez eu possa contribuir de alguma forma para divulgar o que é belo. É esse o propósito de criar este espaço: compartilhar música, comida, livros, humor, lugares, até mesmo os meus próprios devaneios, qualquer coisa que nos inspire a seguir em frente enquanto ainda estamos vivos, qualquer coisa que nos faça ter vontade de viver! Então, se você está interessado em problemas, controvérsias, discórdias, sugiro fortemente que faça um favor a nós dois: procure outra coisa para ler. Tenho certeza que você encontrará. Agora, se você procura algo que conforte um pouco a sua alma enquanto você passa pela vida, seja bem-vindo! Espero que você sinta que veio ao lugar certo. 🙂

MÚSICA PELOS MEUS OUVIDOS

♪ REFLECTIONS OF MY LIFE
Marmalade
[Junior William Campbell, Thomas McAleese]

A razão pela qual essa música veio à minha mente enquanto eu escrevia esses pensamentos não poderia ser mais óbvia:

“The world is a bad place, a bad place, a terrible place to live, but I don’t wanna die”.
“O mundo é um lugar ruim, um lugar ruim, um lugar terrível para se viver, mas eu não quero morrer”.

É tão assustador saber que o mundo que parece um lugar terrível para vivermos hoje já era percebido como tal em 1969. Pior do que isso: sempre foi e sempre será assim. Nenhum progresso tecnológico é suficiente para libertar os corações humanos de serem maus. Ainda assim, enquanto eu tiver uma boa música para ouvir, não quero morrer. [Eu havia listado mais alguns motivos, mas, para não ser injusta, decidi me ater à minha maior paixão, que é uma das principais razões pelas quais criei este site.]

[faixa #7 na playlist Musings N’ Music Soundtrack]


MÚSICA PELOS MEUS OUVIDOS

♪ MAD WORLD
Alex Parks
[Roland Orzabal]

Apesar de ter uma letra mais complexa, aberta a interpretações discutíveis, o motivo pelo qual essa música também me veio à mente quando eu estava escrevendo esses pensamentos é igualmente óbvio: vivemos em um mundo louco — tão louco que às vezes os sonhos em que estamos morrendo são os melhores que já tivemos. Existem vários covers excelentes dessa canção por aí. A versão de Michael Andrews e Gary Jules, por exemplo, parece ainda mais conhecida do que a gravação original do Tears For Fears. Entre as faixas disponíveis no Spotify, a de Alex Parks é a minha favorita até agora. No YouTube, devo registrar que gostei muito da performance de Adam Lambert no American Idol. Agora, estou doida para ver quem vai superar a interpretação do Imagine Dragons (assista ao vídeo abaixo).

[faixa#8 na playlist Musings N’ Music Soundtrack]


BÔNUS

Para mim, a melhor versão de Mad World de todos os tempos! 👇🏻


*Publicado originalmente em 27 de novembro de 2023, no (agora inativo) perfil Musings N’ Music no Medium.


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